domingo, 7 de setembro de 2008

Correr gritar sangrar pensar, nessa ordem.

Sempre quis fazer algo com essa música. Sempre achei ela muito louca: Brainstorm, do Arctic Monkeys, cd de 2007 (Favourite Worst Nightmare). Aproveitem. Ahh... estreiando mais novo player... a saga continua !! ahuahuahuahu





Lá no fim daquele corredor se via a luz do sol que brilhava na rua. No outro ponto oposto a porta lá estava eu parado, na escuridão. Eu estava desesperado. Afrouxei um pouco a gravata, deixei o paletó no chão e olhei para o sapato: ia ser complicado ficar com ele, mas seria pior sem ele. E então, eu comecei a caminhar em direção à porta, e fui acelerando, pegando o pique e, quando percebi a primeira gota de suor, comecei a correr freneticamente.

Tipo o Forrest Gump, tipo quem já atravessou o mar Vermelho, igual quem corre do perigo; entretanto, eu não queria parar para abrir a porta. Fechei o olho, coloquei a mão no ouvido, comecei a gritar e fui em direção, à todo vapor, daquela porta. É engraçado... tampei o ouvido... acho que era, basicamente, porque não queria ouvir mais nada do que ocorria. Queria só correr. Gritar foi um capricho mesmo, meio que para assustar, meio que para realmente me isolar acusticamente do resto. E, quando vi, dei com a cara na porta.

A física não falha. E eu não sou nenhum super-herói. Lei de Newton aplicada... a terceira, não é? Sei lá... só sei que do jeito que eu bati nela, eu voltei. Por isso o galo na testa... quem estava de fora da porta e passava perto deve ter se assustado com barulho, já que, depois da batida, fiquei um pouco deitado no chão, analisando, o nariz sangrando. Levantei, abri a porta, dei uns cinco passos para trás, coloquei as mãos nos ouvidos (cada um em seu lado, sem cruzar... sabe? Então...), e saí correndo, gritando e com o nariz sangrando.

Minha gravata estava encharcada de sangue, mas, tudo bem... acho que não precisaria dela mais. E eu corria, assustava as pessoas, ninguém entendia. Só que foi bom, viu! Experiência legal. Eu corri uns cinco quarteirões bem, depois fui cansando. Quando eu vi a loja daquela velhinha hare crishna, que só vende coisa natural - acho que ela vive de fotosíntese - foi que parei. Sei lá... essa coisa espiritual, de, sei lá!, acreditar em algo não-palpável, sempre me intrigou. Nunca tive foi tempo para participar, entende? Vida moderna é foda, cara! Quando se tem 200 canais em casa, home theater, uma LCD e uma jacuzzi é meio competição desleal... [risadinha amarela] Convenhamos, né?

Mas, aí, na loja, eu entrei. Contei para a velhinha a história, que bati na porta, que vim correndo (eu já estava hiper suado... vida sedentária, já viu, né?), que tinha medo dela. E ela me perguntou o por quê disso tudo. Puxa, foi complicado. Fui lá no meu mais profundo eu e vim falando para ela. Acho que resumi minha vida em uns cinco minutos e 40 segundos, sabe? Contei para ela o que estava passando aqui e lá na empresa e tal... ela entendeu e achou legal que eu contasse isso, sabe?

Aquele esquema meio revolução, meio contexto histórico favorável, meio por fogo no mundo e tal. Por isso, aqui... nessa documentação está o que vocês precisam para por fogo no mundo... devo ter perdido alguns papéis na correria, mas eu vim direto; ela me deu um chá de ervas que, putz!, eu pensei tudo que eu não tinha pensado na minha vida inteira. Algo imprescionante. Meio sem noção, pensando sem pensar no que tá pensando, aquele mar de idéias, aquelas tempestades... brainstorm, sabe?

Mas, assim, não fiquem achando que com essa papelada vocês irão dominar o mundo... hã hã! Do lado de lá é pior. Eles tem até a cor preferida da filha mais nova da empregada, que só vai uma vez por semana, de vocês. Por isso o fogo no mundo, entendeu? E, ó, vou voltar correndo para lá. Tenho ainda mais coisas para fazer, tipo uma revolução, sabe?

Só para saber: algum de vocês tem um fósforo aí? Esqueiro, não... fós-fo-ro... É mais glamour... e, ó, avisa para o segurança que eu não tenho AIDS não... falei só para eles me deixarem passar. Engraçado como todos nós temos medo, não é? Nem importa tamanho nem nada. E nem bomba... quer dizer, a velhinha me deu uma dinamite aqui, mas, pô, é só de erva, essas coisas que ela vende: incenso e tal. Vou até deixar aqui.

Última coisa... ó, obrigado pelo fósforo... então, aqueles lenços de papel, sabem? De limpar, todo perfumado. Alguém tem? Tenho meio uma paranóia quando vejo meu sangue... opa! Obrigado, moça, vou levar a caixa, tá? E obrigado a todos pela atenção, vou sair de fininho, sem atrapalhar ninguém.

[Vai fechando a porta e, antes de fechá-la, num espaço onde só cabia o rosto dele, ele vai fechando e mostrando o sorriso, no mínimo, complexo que ele dava. Sorriso que nunca mais sairia da cabeça de ninguém; nem minha, nem sua.]