De volta, e ouvindo a velha, boa e transcendental Saturate do Chemical Brothers.

Só que naquele dia, a briga dos pais estava muito diferente. Já estavam na fase de que não se importavam mais dos filhos ouvirem. Eles gritavam alto, jogavam coisas e depois sempre vinham descontar algo nele e na irmã... da pior forma possível.
A irmã dele dormia na cama ao lado da dele. E dormia com medo e não conseguia mais sonhar.
O garoto olhava o céu ainda... mas estava deitado. A briga tinha acabado. Debaixo do seu colcha, ele via só um pedaço do céu que sempre estava acostumado a ver. E exatamente nesse pedaço ele viu o que sempre esperava. O sinal.
Ainda mais novo, sua mãe, antes das brigas, contava que estrelas que caem do céu eram penas das asas de anjo e que dava direito a quem as visse, de fazer um pedido. Ele não titubeou e fez o pedido. Acordou a irmã, pediu para ela não fazer barulho porque ele ia realizar o maior sonho dela. Os dois iam em direção da porta da frente, de pijamas e pantufas; passou pelos pais, que tinham voltado a discutir um pouco e, assim, não os viram. Abriram a porta e o menino pegou na mão da irmã e começou a correr como nunca... os cachorros que estavam na rua e nas casas começaram a latir e, os que podiam, corriam atrás deles. Na verdade, os protegiam de qualquer coisa, acima de tudo.
O garoto não tirava os olhos do céu quando podia. Via a estrela cadente seguindo para frente deles e, quando olhou para frente, viu um despenhadeiro. Virou para a irmã e disse que quando ele falasse para ela pular, ela teria que pular o mais forte possível e fechar o olho que daria tudo certo. A irmã, apreensiva, não gostou da idéia inicialmente, mas, no fim viu que daria certo e soltou um pequeno sorriso de aprovação.
Ao se aproximar do despenhadeiro os dois aceleraram, os cachorros ficaram para trás (tristes, pois o garoto gostava muito deles e os tratava muito bem, apesar dos pais sempre brigarem com ele por causa disso). Por fim, saltaram. A irmã, de olho fechado, não abriu. O garoto olhava para cima e com o braço esticado tentou alcançar a estrela. A estrela brilhava como um brinquedo novo, uma realização única. Ele sabia que ninguém nunca havia tentado aquilo, nem nos livros de história que tinha; e que ele iria conseguir e quem sabe virar um livro de história.
Voar é algo único, sentir o vento no rosto e tudo mais é a expressão material de liberdade. O garoto vira para a irmã, que ainda estava com os olhos cerrados e diz que ela já poderia abrir o olho. Ela abre e vê tudo lá embaixo pequenininho e ri... o irmão diz que a mamãe estava realmente certa: estrelas cadentes são penas das asas de anjos. E ainda disse que agora ela poderia voltar a sonhar novamente, deitada numa nuvem qualquer.